#52 Falemos da descida da retenção de IRS
You're never ready for what you have to do. You just do it. That makes you ready.–Flora Rheta Schreiber
Entre as propostas para o Orçamento de Estado 2025 está a redução da taxa de retenção de IRS de 25% para 23% para os trabalhadores independentes (TI). Normalmente os TI não são assunto específico nestas coisas (não se esqueçam que somos uma minoria, mesmo que o número tenha duplicado desde 2013), e o que nos é aplicado, normalmente, vem por consequência do que é aplicado a toda a gente, como as alterações aos subsídios parentais ou ao código do trabalho. Por isso, é claro que a nossa atenção vai para as linhas que nos são exclusivamente dedicadas.
O que significa?
Primeiro, não é uma redução no IRS. Não vai fazer diferença nenhuma no valor de imposto que temos de pagar. A diferença é no quanto adiantamos ao longo do ano: quem agora está a adiantar 25% de cada fatura para IRS, passa a adiantar só 23%. São menos 20€ em cada 1000€ que passam a chegar à conta em vez de serem adiantados ao estado.
“Ouvi dizer que, com o IVA, vai dar ao mesmo.”
Às vezes queremos pôr as coisas de forma tão simplista que só se cria confusão. Não, não vai dar ao mesmo porque são impostos diferentes. Se faturares 1000€+23%IVA, há uma fatia de 23% que é acrescentada, que é IVA e que tem de ser entregue ao estado (nunca chega a ser dinheiro “teu”), mas dos 1000€ de valor base é que ainda vais tirar 23% (ou atualmente 25%). Esse sim, é dinheiro teu mas não chega à tua conta porque é o cliente entrega ao estado, em teu nome, como um adiantamento de IRS.
Depois o que acontece? Das duas uma, ou esse valor vai descontar no IRS e vai aparecer menos a pagar, ou então, se for adiantamento a mais, vai-te ser devolvido. É assim que “recebes” IRS – não é um presente, é dinheiro que adiantaste a mais e que volta para ti. O IVA não, o IVA é acrescentado no fim da fatura e anda de um lado para o outro, “sem compromisso”.
Resumindo, atualmente, num trabalho de 1000€, vais receber na tua conta 1000€ + 23% de IVA - 23% de IRS. Logo, o cliente vai transferir-te 750€ de valor do trabalho + 230€ de IVA (=980€) e vai entregar ao estado os 250€ (25%) como adiantamento do teu IRS. Exemplo no print do Moloni1 em baixo.
Se a percentagem dos dois impostos for a mesma, parece que vai dar ao mesmo – em vez de 980€, chegam 1000€ à conta, sim, mas desses 1000€ ainda tens de pagar o IVA. Sobram 770€ em vez de 750€. Os tais +20€ em 1000€ que dizia. A diferença é pequena, malta. São +2% de liquidez ao longo do ano.
No limite, acho que, o que gera confusão, é o valor da retenção passar a ser igual ao do IVA (ambos 23%). Se já há tantas dúvidas nas regras para dois impostos, ainda vai haver mais.
Mas a minha retenção não é 25%. Vai mudar?
A maior parte dos trabalhadores independentes faz retenção de 25%, mas há certos casos em que pode ser 16,5% ou 11,5%. Podes ver mais sobre este assunto no artigo 101.º do Código do IRS (CIRS).
Se o imposto não baixa, o que é que interessa?
Repito, é uma mudança muito pouco significativa, não vamos festejar 2%, mas fala-se disto porque, ao contrário do que acontece com os trabalhadores por conta de outrem, que têm tabelas de retenção na fonte que variam não só com o rendimento mas com as circunstâncias familiares (se são casados, se têm filhos e quantos, se há grau de deficiência), nós temos um standard igual para toda a gente e também precisávamos dessa plasticidade de aplicação.
Um TI com dois filhos que ganha 25.000€ ou um TI sem filhos que ganhe 45.000€ são situações muito diferentes, vão ter uma taxa efectiva2 de IRS muito diferentes, mas nos dois casos podem estar a adiantar 1/4 daquilo que faturam.
TLDR; o que acontece com os 25% (futuros 23%) é que esse dinheiro não chega à nossa conta e, mesmo que nos seja devolvido quando está a mais, podia ser bem mais interessante ter mais liquidez ao longo do ano e decidirmos nós o que fazer com ela – investir, comprar material, fosse o que fosse –, em vez de estar a ser uma espécie de empréstimo anual, sem juros, ao estado.
Até breve,
Sofia
Para seguir
Mariana, a Miserável
A primeira vez que me cruzei com o trabalho dela foi em Leiria, numa longínqua exposição (2010?) chamada “Exposição Miserável que, apesar de tudo, tem rissóis”, com uns cartazes serigrafados a verde e preto. 14 anos depois, se há ilustradores no vosso instagram, será difícil que não a conheçam, mas, mesmo assim, é a sugestão desta edição: A Mariana, a Miserável põe em desenho muito do que sentimos como independentes. Começa-se a seguir por um post, fica-se pelo sentido de humor e a melancolia. Ver também o site.




Da internet
Marine Traffic
Já sabem que gosto destas coisas. O que mais gosto neste mapa é que, por momentos, nos troca as voltas quanto ao que é mar e o que é terra.
Ler/ver/ouvir
Money dysmorphia, afeta a maneira como olhamos para o dinheiro e o artigo refere que é predominante nos nascidos entre 97-2012, mas acho que é perfeitamente relacionável para quem nasceu antes disso. Why so many Gen Zers and millennials have 'money dysmorphia' — even if they are financially better off than they realize.
Como mãe, a internet traz-me uma camada muito espessa de preocupação com o futuro. Este artigo, The Perfect Girlfriend, explora uma parte que ainda consideramos nicho mas que se prevê que cresça (e muito) nos próximos anos. Uma perspetiva nova sobre o apocalipse também: “According to a recent article in the scientific journal Nature, a majority of AI experts believe there is at least a 5 percent chance that superintelligent systems will kill off humanity. But maybe, just maybe, AI won’t off us by unleashing nuclear weapons or a synthetic virus. Instead, it will fall in love with us. Or rather, cause us to fall in love with it and stop procreating with other humans.”
Estou a acabar de ler o Atos Humanos da Han Kang, que ganhou o prémio Nobel este ano, e estou arrebatada com tudo o que ela consegue pôr em tão poucas frases. Tanta crueldade, tanta angústia, tanto amor, tanta humanidade. Ontem li o penúltimo capítulo e chorei muito (as hormonas da gravidez não ajudam!). Um livro-janela, que nos deixa presos ao chão e, no fim, pessoas um bocadinho diferentes do que éramos.
Entretanto, no luscofia
Vou repetir o webinar Parentalidade para Freelancers! Depois de uma bela edição, com ótimo feedback, o ano passado, este ano melhoro-o, acrescento mais material bónus e vai acontecer no dia 20 de novembro às 21h30.
Se não for por ti, partilha com alguém que conheças e que esteja a planear ser mãe/pai nos próximos tempos – sobretudo se for trabalhador independente!
Link afiliado
A percentagem que realmente acabas por pagar de IRS, em relação ao teu rendimento. Vem escrita no cantinho da nota de liquidação.
Obrigada <3